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O queijo brasileiro como luxo global: a redescoberta da identidade nacional no prato

  • Foto do escritor: Maiara Rodrigues
    Maiara Rodrigues
  • 29 de out.
  • 3 min de leitura

Do sertão mineiro às mesas estreladas de Paris, o queijo brasileiro vive um momento de renascimento. Antes visto como produto rústico e regional, ele hoje desponta como símbolo de luxo, identidade e inovação gastronômica. Em meio a prêmios internacionais e chefs renomados que o colocam no centro de seus menus, o Brasil redescobre a própria riqueza artesanal e transforma o queijo em embaixador de sua cultura.


diferentes queijos

Da roça ao mundo: o resgate de uma tradição esquecida


Durante décadas, o queijo brasileiro especialmente os feitos com leite cru, como o Canastra, o Serro e o Araxá enfrentou resistência e preconceito. A legislação sanitária rígida e o domínio de produtos industrializados afastaram muitos produtores tradicionais.Mas a virada começou nos anos 2000, quando pequenos queijeiros, apoiados por associações regionais e movimentos de valorização do terroir, retomaram técnicas ancestrais e passaram a buscar certificações de origem.


Hoje, o país conta com dezenas de indicações geográficas e prêmios conquistados em concursos na França, na Itália e na Inglaterra. “Foi um trabalho de resistência cultural”, resume uma produtora de São Roque de Minas. “Durante anos, chamavam nosso queijo de rústico. Agora, é sinônimo de autenticidade.”


Perfis de quemijos que viraram embaixadores


No coração da Serra da Canastra, famílias queijeiras mantêm saberes transmitidos há gerações. O mineiro João Leite, por exemplo, herdou de sua avó o ofício e hoje exporta para restaurantes de Londres e Lisboa. “Meu avô fazia queijo para sobreviver. Eu faço para mostrar quem somos”, conta.


No Sul, produtores do Paraná e de Santa Catarina têm apostado em variedades inspiradas nos moldes europeus — como o tipo brie e o camembert — mas com ingredientes locais, como leite de búfala ou ervas nativas. Na Amazônia, surge uma nova fronteira: queijos maturados com cascas de frutas regionais e fermentos naturais da floresta. O resultado é um portfólio diverso que redefine o que é “sabor brasileiro”.


Do campo à alta gastronomia: a nova estrela dos restaurantes premium


Restaurantes premiados em São Paulo, Rio e Belo Horizonte têm incorporado o queijo brasileiro como protagonista de pratos autorais. Em menus degustação, o Canastra é servido com mel de abelhas nativas, enquanto o queijo Tulha — paulista, de longa maturação — é usado como base para molhos sofisticados.Chefs internacionais também têm se rendido ao sabor. Em Paris, o estrelado chef François Lenoir incluiu um “fromage du Brésil” em seu cardápio: uma seleção de queijos mineiros acompanhados de vinhos do Vale do São Francisco. O gesto, segundo críticos franceses, simboliza “a chegada do Brasil à mesa do mundo”.


Mais do que moda, trata-se de uma valorização da origem. “Antes, a alta gastronomia brasileira importava produtos franceses. Agora, exporta identidade”, avalia uma pesquisadora de cultura alimentar da USP.


Soft power gastronômico: o queijo como símbolo nacional


O auge simbólico dessa virada veio em 2024, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva presenteou Emmanuel Macron com uma caixa de seis queijos brasileiros um gesto de diplomacia cultural que repercutiu no mundo inteiro. O presente, cuidadosamente selecionado por produtores e especialistas, foi visto como coroação de décadas de luta pela valorização dos queijos artesanais.


O episódio ajudou a consolidar o queijo brasileiro como instrumento de soft power ou seja, de influência cultural e identidade nacional. Assim como o vinho é para a França ou o presunto ibérico para a Espanha, o queijo tornou-se expressão da brasilidade em sua forma mais autêntica: artesanal, diversa e afetiva.


O futuro: entre desafios e reconhecimento


Apesar do sucesso, o setor ainda enfrenta desafios. A burocracia para exportação, a falta de padronização sanitária entre estados e a necessidade de apoio técnico continuam limitando o crescimento de muitos pequenos produtores. Ao mesmo tempo, o interesse do público urbano e a abertura de mercados gourmet no exterior indicam um horizonte promissor. O Ministério da Agricultura já estuda ampliar políticas de certificação e promover o produto em feiras internacionais.


Especialistas estimam que, até 2030, o Brasil possa dobrar a produção artesanal e conquistar fatias significativas de mercados premium na Europa e na Ásia. Mais do que números, é o reconhecimento de uma história de resistência e sabor.


Conclusão


O queijo brasileiro ultrapassou as fronteiras do prato: tornou-se símbolo de orgulho, cultura e sofisticação. Ao reconectar o país com suas raízes rurais e ao mesmo tempo projetá-lo no cenário global, esse renascimento dos queijos artesanais reafirma uma ideia poderosa a de que o verdadeiro luxo nasce da autenticidade.

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