O futuro da comida é plant-based?
- Maiara Rodrigues

- 1 de ago.
- 3 min de leitura
Atualizado: 15 de ago.
Nas grandes capitais brasileiras, não é raro encontrar cafés, padarias, restaurantes e até botecos oferecendo versões veganas de pratos tradicionais. Feijoada sem carne, coxinha de jaca, hambúrguer de grão-de-bico e doces sem leite se espalham pelas vitrines como sinais de uma transformação silenciosa e, ao mesmo tempo, barulhenta no modo como o país se alimenta.
Mas será que essa onda plant-based veio para ficar? Ou será apenas mais uma tendência entre tantas que já passaram pela gastronomia brasileira?

Não é só sobre alface
A primeira barreira para se falar em comida vegana no Brasil é o imaginário. Ainda é comum associar o veganismo a uma alimentação limitada, cara ou sem graça. Mas a realidade é bem diferente: os pratos à base de plantas, além de criativos, têm conquistado públicos diversos desde os que buscam saúde até os que se preocupam com sustentabilidade ou direitos animais.
Mais do que substituir ingredientes, a cozinha vegana exige reinvenção. É preciso redescobrir texturas, reinterpretar técnicas e reaprender a extrair sabor de onde antes se ignorava. Nesse processo, couve vira chips, inhame vira maionese, banana verde vira carne. É uma gastronomia de descoberta.
Tendência global, adaptação local
A ascensão da alimentação plant-based é um fenômeno mundial. Em países como Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos, o veganismo já deixou de ser nicho e virou mercado consolidado. No Brasil, embora ainda em fase de expansão, o crescimento é notável segundo o Ibope, 14% da população brasileira já se declara vegetariana, e esse número só tende a aumentar.
Mas adaptar essa tendência à cultura alimentar brasileira não é tarefa simples. Nosso repertório gastronômico é profundamente marcado por carnes, queijos e preparos de origem animal. A mudança, portanto, não passa apenas pelo paladar, mas também pelo afeto, pela tradição e pela memória.
O desafio da democratização
Se por um lado vemos cardápios veganos em restaurantes autorais e empórios sofisticados, por outro ainda é difícil encontrar opções acessíveis em bairros periféricos ou estabelecimentos populares. A alimentação vegana, no Brasil, ainda circula majoritariamente entre classes médias e altas.
O desafio está justamente aí: fazer com que o plant-based deixe de ser privilégio e se torne possibilidade real para todos. Isso implica incentivar agricultura orgânica local, políticas públicas de alimentação escolar, formação de cozinheiros com repertório vegetal, além de comunicação menos elitista.
A potência invisível das cozinhas tradicionais
Curiosamente, muitas das nossas receitas mais antigas especialmente aquelas de origem indígena ou africana já são, por essência, plant-based. Pratos como o acaçá, o pirão de mandioca, os refogados de ora-pro-nóbis, as farofas com banana-da-terra ou os mingaus de milho revelam uma culinária rica, ancestral e naturalmente vegana, que há muito tempo alimenta o Brasil fora dos holofotes.
Talvez o futuro da comida plant-based no país não esteja nas prateleiras dos supermercados chiques, mas nas panelas de barro das comunidades tradicionais, nos quintais das avós e nos ingredientes nativos que ainda resistem.
Comer é também um ato político
Optar por uma alimentação sem origem animal é, para muitos, uma escolha ética. Para outros, é questão de saúde ou impacto ambiental. Mas, seja qual for a motivação, o fato é que a comida está no centro das transformações que vivemos e o veganismo é uma das pontas mais visíveis dessa mudança.
A gastronomia plant-based desafia o status quo, propõe novos sabores e questiona velhos hábitos. E talvez por isso incomode tanto. Afinal, mudar o que se põe no prato é, em alguma medida, mudar o modo como se olha para o mundo.
O futuro pode mesmo ser plant-based. Mas, antes de tudo, ele precisa ser possível, acessível e saboroso. Porque ninguém muda o que come só com argumentos é preciso que haja afeto, acolhimento e, claro, um prato que surpreenda o paladar.
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