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Entre o terroir e o território: a valorização dos ingredientes brasileiros na alta cozinha

  • Foto do escritor: Maiara Rodrigues
    Maiara Rodrigues
  • 31 de jul.
  • 2 min de leitura

Atualizado: 4 de ago.

Durante muito tempo, a alta gastronomia no Brasil olhou para fora. Os ingredientes franceses, os cortes japoneses, os métodos italianos tudo o que vinha de longe era visto como mais refinado, mais técnico, mais digno de um menu degustação. Enquanto isso, a riqueza dos nossos biomas, os sabores da roça, os saberes ancestrais… eram deixados à margem do prato.


Mas isso está mudando. E é uma mudança que começa no chão.


Bandeijas com açai, farofa de mandioca e tapioca

Cada vez mais chefs e casas renomadas têm voltado o olhar para dentro: para o cerrado, a Amazônia, a caatinga, a mata atlântica. Para os ingredientes que nascem sob o sol tropical, irrigados por culturas populares, por histórias de resistência, por rotas esquecidas. Estamos aprendendo, enfim, que a sofisticação pode ter gosto de jabuticaba, textura de pequi e perfume de coentro fresco.


Do terroir ao território


Na França, o conceito de “terroir” representa a junção de solo, clima e tradição que dá identidade a um vinho, queijo ou alimento. No Brasil, a noção de “território” carrega ainda mais camadas: além da geografia e da cultura, ela fala de ancestralidade, exclusão, memória, disputa de narrativas.


Valorizar o território é mais do que incluir ingredientes locais no cardápio. É reconhecer de onde eles vêm, quem os cultiva, como resistem. É dar crédito e renda a comunidades quilombolas, indígenas, ribeirinhas e extrativistas. É transformar o menu em mapa vivo da diversidade brasileira.


Ingredientes com sotaque


Baunilha do cerrado, cogumelos nativos da mata atlântica, tucupi, farinha de araruta, biju de mandioca, castanha-de-baru, pirarucu de manejo sustentável, pimenta-de-cheiro, jambu. Ingredientes que antes eram vistos como “exóticos” demais para o prato branco de porcelana, hoje ganham destaque em menus premiados.


Mas isso não é sobre gourmetizar o que é popular, é sobre tirar da invisibilidade o que sempre foi extraordinário.


Alta cozinha ou cozinha alta?


A chamada alta gastronomia, quando abre espaço para os sabores do Brasil profundo, também passa a se reconstruir. Afinal, cozinhar com ingredientes locais exige reaprender a escutar mais, testar menos, respeitar o tempo da natureza. E isso muda tudo: a técnica, o ritmo, a criação.


É quando o ato de cozinhar vira também um ato político: de preservar, de resistir, de recontar a história por meio do paladar.


Um país do tamanho de um banquete


Falar em valorização dos ingredientes brasileiros é também reconhecer que a nossa cozinha não tem uma só cara. São muitas: a do Norte que fermenta, a do Sul que defuma, a do Nordeste que seca e tempera, a do Sudeste que mistura.


Quando esses sabores ganham lugar na mesa dos restaurantes estrelados com seus nomes, suas origens e seus significados preservados, o Brasil começa a se provar a si mesmo.


Porque o futuro da alta gastronomia, por aqui, talvez não esteja nas espumas nem nos sous-vide. Esteja nas raízes. Literalmente.


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